terça-feira, 31 de agosto de 2010

Moacyr Scliar outra vez

A jaqueta mágica

De repente, um homem sorridente a deteve na rua e ofereceu sua jaqueta para que se sentisse melhor


Moda para a alma: você fica triste, sua jaqueta o acolhe. Pesquisadores criam roupas capazes de detectar alterações emocionais e emitir mensagens de conforto para o usuário. EQUILÍBRIO, 24.AGO.10

DEPOIS DE UM CASAMENTO malsucedido, precocemente encerrado, ela passou a viver sozinha: homem em minha vida, nunca mais, dizia às amigas. O tom era orgulhoso, mas a verdade é que no fundo sentia-se muito angustiada.
Voltava do trabalho para o pequeno apartamento em que agora morava, comia alguma coisa e em seguida tinha de sair: não suportava a solidão.
Ficava horas vagando pela rua, mesmo sabendo do perigo que isso representava, e talvez por causa do perigo que isso representava: pouco lhe importava o risco de assalto, pelo menos representaria algo de novo em sua vida monótona.
E aí veio o inverno, e as noites geladas, mas mesmo assim saía para suas caminhadas. Numa noite, a temperatura caiu demais e ela, mal abrigada, começou a tremer de frio.
Avançava contra o vento, encolhida, sem olhar para os lados, quando de repente alguém a deteve: um homem jovem, sorridente, que a mirava, divertido.
"Dessa maneira você vai congelar", disse. E o que é que você tem com isso, ela ia perguntar, não sem irritação, mas antes que o fizesse, ele tirou a jaqueta: "Vista isso, você vai se sentir melhor".
A atitude poderia ser considerada imprudente, mas que lhe importava a imprudência? Ela vestiu a jaqueta. E imediatamente sentiu-se de fato melhor, aquecida, reconfortada. Mais que isso, do capuz, e talvez através de algum minúsculo alto-falante, vinha uma música que era suave, romântica.
Ele riu do assombro dela e explicou: era uma jaqueta que ele trouxera de Londres, uma novidade tecnológica que continha vários dispositivos para fazer a pessoa se sentir melhor: sensores que mediam a temperatura e acionavam um sistema de aquecimento, sistema de som. Perguntou onde ela morava, ofereceu-se para acompanhá-la. Seria bom dizer algo como "casaram e foram felizes para sempre".
Mas não foi isso que aconteceu. Já estavam morando juntos, cada vez mais apaixonados, mas uma noite, voltando do treino de futebol de salão, ele foi assaltado, reagiu, e acabou sendo morto com um tiro.
O ladrão furtara-lhe os tênis e, aparentemente, tentara levar também a jaqueta, mas não conseguira.
É essa jaqueta, ainda com o furo da bala, que ela usa, quando sai do apartamento à noite, para caminhar sozinha pelas ruas desertas. O sistema de aquecimento já não funciona, o sistema de som também não, mas a isso a ela não importa.
O que importa é caminhar e lembrar a noite em que encontrou um homem jovem, sorridente, um homem que, emprestando-lhe uma jaqueta, mudara, como num passe de mágica, sua vida.
Mais: caminhando ela tem a esperança de encontrar alguém. Alguém que também seja jovem, alguém que esteja tremendo de frio. A essa pessoa ela cederá a jaqueta mágica, sem pedi-la de volta. E regressará para seu apartamento, consolada, sabendo que, apesar de tudo, algum sentido existe na vida.

MOACYR SCLIAR escreve no caderno Cotidiano, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas no jornal.
moacyr.scliar@uol.com.br

Tem, mas acabou...




A sorte; a esperança; o sonho; a inocência; o desejo; a razão; a emoção; a paciência; a quietude; a consciência; a criatividade; a energia; a fome; a força; a coragem; a vontade de ser...

sábado, 21 de agosto de 2010

Declarações


Descobri nesse blog uma forma de descarregar todos os meus sentimentos. Uma maneira de me declarar sem (me) constranger e sem sofrer.

Infinito Desejo
Maria Bethânia

Ah! infinito delírio
Chamado desejo
Essa fome de afagos e beijos
Essa sede incessante de amor
Ah! essa luta de corpos
Suados
Ardentes e apaixonados
Gemendo na ânsia
De tanto se dar
Ah! de repente o tempo
Estanca
Na dor do prazer que
Explode
É a vida é a vida, é a vida
E é bem mais
E esse teu rosto sorrindo
Espelho do meu no vulcão
Da alegria
Te amo, te quero meu bem
Não me deixe jamais
Eu sinto a menina brotando
Da coisa linda que é
Ser tão mulher
A santa madura inocência
O quanto foi bom e pra
Sempre será
E o que mais importa
É manter essa chama
Até quando eu não mais
Puder
E a mim não me importa
Nem mesmo
Se Deus não Quiser

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

25 anos!


Nada como um monte de abraço e os olhinhos brilhando outra vez num frio 18 de agosto.

Foi divertido sair por aí anunciando meu aniversário e pedindo abraço. Alguns se assustaram, mas quando vi lá estava eu ganhando um super-abraço. Teve gente que ligou, mandou mensagem. Teve gente que não disse nada, mas até o carinho mais distante deu pra sentir.

Uma amiga fabulosa me disse certa vez que amigo não precisa estar junto pra gente saber que é amigo. Como isso é verdade! E que saudade que dá!

Ainda bem que

"o meu aniversário é um nascer toda hora
E nosso amor, que brotou do tempo,
não tem idade pois só quem ama escutou o apelo da eternidade." (Carlos Drummond de Andrade)

domingo, 15 de agosto de 2010

Come on and dance with me



Tentar prever os efeitos do aquecimento global sobre o El Niño é igual a amar e querer saber se vai sofrer.

sábado, 14 de agosto de 2010

Revira volta


Roda Viva
Chico Buarque

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu...

A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá ...

Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a roseira prá lá...

Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...

A roda da saia mulata
Não quer mais rodar não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou...

A gente toma a iniciativa
Viola na rua a cantar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a viola prá lá...

Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...

O samba, a viola, a roseira
Que um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou...

No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a saudade prá lá ...

Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...


Tenho o estranho costume de cantar músicas inteiras sem prestar atenção na letra. Até que um dia a ficha cai e eu penso que deveria ter dedicado mais tempo pra isso antes.

Será que tem mais alguém que é assim?

domingo, 8 de agosto de 2010

Monocromático...

... é um trabalho que tenho que fazer.

Achei muito combinante e roubei de Luiza de Fato o seguinte:

.
seu tudo é monocromático e enquanto eu engulo o arco íris você me cospe seu tão pobre tudo.

Tudo com moderação, até mesmo a própria moderação. (Buda)


Aprender a gostar com moderação é tarefa difícil pra mim, a romântica incorrigível de sempre. Contudo, depois de tanto tempo sozinha, comecei a dominar um pouco esses meus sentimentos impulsivos e a não concentrar meu muito amor e minha energia em uma só pessoa. Até me surpreende, às vezes, a frieza com que encaro certos relacionamentos.

Venho sendo feliz assim. Quando me falta um abraço ou um cafuné, encaro logo como TPM, que passa, depois de cerca de 15 dias de choro, chocolate e emoções fortes.

...

Vinha sendo feliz assim... Até aparecerem uns olhinhos brilhantes que fizeram brilhar os meus também... até que um sorriso sincero me trouxe a alegria do encontro outra vez. E me dá um frio na barriga. Mas não uma vontade louca de me entregar e me perder. Só um arrepio na espinha, um será que sim | será que não.

Então, me distraio com tanta coisa pra fazer, tanta coisa pra pensar, tanta coisa pra querer. O será que sim | será que não me acompanhando ao longo do dia, me arrancando sorrisos aleatórios, me fazendo querer, pensar, fazer e viver muito mais tudo o que é meu!


"O companheirismo nasce
da separação.
Para obter o companheirismo
comece separadamente.
Desta forma poderá haver
tanto companheirismo quanto separação."


Buda

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

1 (uma) cabeça de gado


Especialmente hoje, gostaria de contar sobre algo recorrente nas palavras de Marcel Proust, sobre a forma como percebemos as coisas e as pessoas, dependente, em parte, de um ato intelectual.

"Nem mesmo com referência às mais insignificantes coisas da vida somos nós um todo materialmente constituído, idêntico para toda a gente e de que cada qual não tem mais do que tomar conhecimento, como se se tratasse de um livro de contas ou de um testamento; a nossa personalidade social é uma criação do pensamento alheio. Até o ato tão simples a que chamamos 'ver uma pessoa conhecida' é em parte um ato intelectual. Enchemos a aparência física do ser que estamos vendo com todas as noções que temos a seu respeito e, para o aspecto total que dele nos representamos, certamente contribuem essas noções com a maior parte. Acabam elas por arredondar tão perfeitamente as faces, por seguir com tão perfeita aderência as linhas do nariz, vêm de tal modo nuançar a sonoridade da voz, como se esta não fosse mais que um transparente invólucro, que, de cada vez que vemos aquele rosto e ouvimos aquela voz, são essas noções o que olhamos e escutamos."

Partindo desse pensamento, descobri que o meu dedão do pé pode não ser bonito como eu imaginava e que a roupa, a princípio, estranha, da menina no ponto de ônibus não era tão absurda assim. Foi ainda com essa ideia na cabeça que tentei encarar o meu dia, porque quarta-feira é dia de vaca braba outra vez (ver Desabafo a la Macunaíma - Junho). Ela continua brava, até mais talvez. Mas... na boa?! Eu sou mansa. E é isso que importa!


PS: Estou lendo Proust vagarosamente e já entendi que para recuperar minhas páginas vou ter que ler outra coisa ao mesmo tempo, notícias, artigos, crônicas, piadas, revistas, livros... sei lá.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Bom dia!

O fim de semana foi bem agitado. Parei de contar páginas para curtir amigos. Queria poder contar 30 amigos e mais, todos comigo ao mesmo tempo. O resultado foi que fiquei com um débito exorbitante de páginas, não dormi e nem comi direito e a casa ficou meio revirada. Mas eu amei!!! Ainda acordei, na segunda-feira, às 6:40, ganhei um abraço de uma grande amiga e ouvi no rádio o Vander Lee cantar assim: "Bom diiiiaaa! Como estar vivo é bom!". É como ter ano novo... fora de época.


RECEITA DE ANO NOVO

Carlos Drummond de Andrade

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.